«Música alternativa / porque não é para a maioria / Música agressiva / porque não tem fantasia» VRZ in Matarroêses (Matarroa; 2003)
O Hip-Hop, no meio das pessoas que gostam de Rock é considerado uma merda qualquer de atrasado mental. É um género de música que significa vídeos cheio de rabos de pretas e de letras sobre dinheiro & fama – estranho… e o famoso “Sex, Drugs & Rock’n’Roll” é assim tão diferente!? O facto de um género musical ser conhecido pelo que a MTV nos bombardeia é tão paradoxal como pensar que o Rock equivale a aberrações como os Poison ou os Strokes ou os Puddle of Mud. Que as pessoas conheçam apenas o recente e imbecil The Massacre [Shady / Aftermath / Interscope / Universal; 2005] do 50 Cent, que faz parte de um panteão de deuses (Hip-)Pop, um género inteiro não pode descriminado até porque há também um underground do Hip-Hop. E falo daquele underground constituído por artistas e visionários, de músicos que inovam, que refrescam e que emocionam. Não do underground “estagiários para a fama” como há milhares bandas por ai, que dizem-se “alternativas” só porque ainda não tiveram sucesso mediático e como tal refugiam-se sobre a capa nobre da “marginalidade”.
Tal como o Punk ou o Industrial, o Hip-Hop durante uns tempos deu a entender que seria um novo género com garantia de liberdade criativa máxima (1) infelizmente também foi reduzido a meia dúzia de cânones para as massas consumirem facilmente. O Punk não é Green Day, o Industrial não é Rammstein, nem Hip-Hop é Puff Daddy. Quem já ouviu os clássicos Public Enemy (com ou sem os Anthrax) ou Cypress Hill ou N.W.A. (2) já o devia saber. Considerando que a explosão do “Hip-Hop artístico” já não é mediática e tudo o que ouvimos por ai é Da Weasel a fazer jingle para a MacDonalds ou outros anormais MTV, aqui vai uma pequena sugestão de discos para os audiófilos sem preconceitos.
Anticon label sampler: 1999-2004 [Anticon / Sabotage; 2004] como o nome indica, é um CD que compila várias faixas editadas ao longo da actividade da Anticon, um colectivo/editora de artistas amantes de Hip-Hop e que procuram a liberdade de criação através das técnicas líricas e sonoras deste estilo de música. Neste disco de 80 minutos encontramos letras sobre visões pessoais acompanhadas por uma amálgama de sons que vão por paisagens electrónicas, sons abstractos e/ou quase-industriais, beats sujos. Quase que se pode dizer que estamos perante uma espécie de Folk mutante & urbano onde o Beck não teve coragem de continuar após a fama dos álbuns pela Geffen. Parte do futuro do Hip-Hop enquanto Arte passa por aqui.
Absence [Ipecac / Sabotage; 2004] é o novo CD dos Dälek. É daqueles discos que obrigam um ouvinte a parar de fazer seja o que estiver a fazer para ouvi-lo. Como ler um livro, obriga à concentração de tão intenso que é. Os samples são ruidosos e distorcidos como se tivessem sido retirados das guitarras de Sonic Youth ou do “noise” de Merzbow. As batidas ajudam a absorver o ruído industrial. As rimas/voz também. As letras são sobre uma América sufocada até ao tutano na diferença de classes raciais e económicas [o Michael Jackson ou o O.J. Simpson podem ser pretos e só não foram “de cana” porque… são ricos!]. “Absence” é um monstro sonoro que nos dá esperança na música. Afinal nem tudo já foi inventado, ao contrário ao que os cabrões preguiçosos apregoam por ai como uns alarves. Fodam-se! Aqui, a música é sem classificação a não ser esta: "it grows on you".
Os gajos de Puppetmastaz são feios comó-caraças e o CD de estreia Creature funk [New Noise / Labels; 2003] prova que eles sabem fazer o melhor Hip-Hop em Berlim numa mistura saudável e divertida de "old-school" e "new-school". Isso deve-se às batidas bem sacadas, às várias vozes caricaturais dos MC's, aos samples bem ecléticos que passam por secções de cordas de música clássica, pela música sul-americana (paródia aos Orishas!?) e pelos sons electrónicos, ao humor non sense das letras e dos separadores - ex.: Elvis está a cantar e é interrompido para atender um telefone, do outro lado os Puppetmastaz repetem-lhe a frase «Elvis is shellfish!».
Pelo que ouvi dizer, os mentores deste projecto tocavam em bandas Hardcore e decidiram mudar para melhor, tal é a qualidade da música. Ah! Sim! Resta dizer que os Puppetmastaz são um colectivo de 8 bonecos que lembram os "Feebles" do Peter Jackson pelo aspecto idiota e asqueroso. Estes “Marretas do Hip-Hop” pretendem ser o Nº1 no mundo se os humanos não os tramarem: «Humans get all the credit. They gonna regret it. It was a puppet who said it!». Para todas as idades.
Ancient Termites [Bomb Hip-Hop; 1998] de PhonospychographDISK conta com participações de cromos tão diferentes como o virtuoso guitarrista Buckethead (ex-Guns’n’Roses), o baterista Brain (Primus, Tom Waits), e o baixista Bill Laswell (Material, Painkillers, 500 outros projectos) que curiosamente irão trabalhar mais tarde juntos no fantástico e híbrido Warsawa (Innerhythmic; 1999) como Praxis. Apesar de ser um álbum antigo, só o descobri à pouco tempo, tal como outra colectânea da editora Bomb Hip-Hop, que pelos vistos tem um forte catálogo discos de “scratch” e “turntablism”, ou seja, pegar em dois gira-discos e fazer música misturando ao vivo como quem toca uma guitarra – base de criação instrumental do Hip-Hop dos primórdios. Há cromos para tudo como se sabe, e há cromos bons. Este PhonospychographDISK é um deles, tal é capacidade de recriar os discos usados em novos ambientes sonoros bizarros… para quem gostou do General Patton vs. the X-ecutioners.
«A bastard child of Reaganomics posed in a B-Boy stance
Make our leaders play minstrel, Left with none to lead our people.
How the fuck am I gonna shake your hand, when we never been seen as equals?» diz Dälek (nome do MC e da banda) algures no “Absence”. Acho que resume a distância equidistante entre estes exemplos aqui descritos e o nojo das “starletes” Hip-Hop.
Notas:
(1) O Punk tinha a atitude “não sei tocar mas que sa-foda sei que tenho algo para dizer”, no Industrial idem idem aspas aspas com a vantagem tecnológica ou histórica-artística (colagens Dada, música concreta) de criar novos sons. O Hip-Hop na teoria é algo parecido: o MC diz/declama rimas, o Produtor/DJ pode sacar “break beats” ou “samples” de qualquer registo fonográfico para fazer a música. Para compreender a importância do Hip-Hop aconselho a investigação dos artigos de Rui Miguel Abreu em vários números da extinta (?) revista Op.
(2) Estes últimos com o “Fuck the police” estiveram a um nível dos Sex Pistols quando foi o “God saves the Queen” em 1977.
segunda-feira, 25 de julho de 2005
sábado, 9 de julho de 2005
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