Eis uma agradável surpresa este livro, pelo menos para um ex-residente de Cascais e curioso do Jazz. Desconhecia completamente que a implantação e desenvolvimento do Jazz em Portugal passou sobretudo pela Linha do Estoril - claro que a evolução do Jazz em Portugal deixou de acontecer por estas bandas a dada altura porque as iniciativas do concelho foram quase sempre para o Jazz cristalizado, comercial e para o tio & tia fingirem que gostam.
Assente nas histórias dos empresários Erico Braga (1893-1962), Luís Villas-Boas (1924-1999) e Duarte Mendonça (1931-) e a forma como sempre tentaram dinamizar e divulgar o Jazz em Portugal, o que nunca foi fácil porque essa música era do Diabo! Para o Estado Novo, pior que saber que esta música punha o pessoal a dançar e pular era ainda mais inconcebível saber que os músicos negros não eram os selvagens que os "bons portugueses civilizavam em África".
O livro é bastante agradável no que respeita à leitura do texto e das imagens / documentos que aparecem. Não chega à leviandade dos "foto-livros" que nada dizem - é irónico que neste país pouco dado às imagens tenha começado nos últimos anos a serem editados montes de livros só com fotografias mas novamente com pouco ou nenhum contexto escrito, crítico ou narrativo - mas também não é uma enciclopédia exaustiva para cromos do Jazz.
Fiquei a conhecer as razões da existências de discotecas, teatros, clubes, casinos em Cascais e Estoril, como por exemplo, nunca pensei que o Palm Beach ou Bauhaus (discotecas dos betos) tinham começado por serem lugares de música Jazz, abertos em 1941 e 1955 respectivamente. Aliás, o Bauhaus chamava-se Ronda - acho que o Camarada Gouveia já me tinha contado. Agora percebo a decadência da noite cascaense nos anos 90 quando lá vivia...
As melhores histórias contadas passam pelo festival Cascais Jazz onde vamos encontrar as drogarias e extravagâncias de Miles Davis (em 1971), o incidente político de Charlie Haden (no mesmo ano) ou as exigências "da época" (estamos no PREC, em 1975) do grupo Plexus, ao qual faziam parte o Rui Neves (actual Director do Jazz em Agosto) e Carlos "Zíngaro" (músico e autor de BD) que ilustrou um panfleto contestário. Dos anos 80 para frente, com mais ou menos pobreza ou riqueza de meios e de apoios, os movimentos ligados ao Jazz na linha vão ficando profissionais e instítuidos, ou seja, deixa de contar episódios caricatos nem nada que valha a pena ler. Se por um lado permitem a edição de um livro como este (com o apoio da Câmara Municipal de Cascais), por outro chegamos ao fim da linha.
Em completa antítese ao livro anterior está o mono-volume Duarte Mendonça : 30 Anos de Jazz em Portugal 1974-2004 (CM de Cascais; 2004), também redigido por JM dos Santos. É o pior que a despesa pública consegue fazer porque não sabe delegar o dinheiro a quem sabe fazer como deve ser - o livro anterior é exemplo disso, aliás, apoiado pela CM de Cascais mas produzido por editores particulares.
Este é um livro luxuoso com design horroroso e disfuncional, que deveria servir para homenagear a Duarte Mendonça pelo seu bom trabalho que fez em promover o concelho e o Jazz. Porque é que o designer - já agora o nome: David Santos, para quando cruzarem com ele não lhe pedirem ajuda ou trabalho - coloca uma moldura enorme ao longo de todas as páginas? Além de parecer um convite de casamento torna o livro pesado em número de páginas e peso. Porque faz páginas duplas com algumas fotografias quando elas não tem esse tamanho e com isso ficamos com elas cortadas? Nada faz sentido... Sendo que ainda por cima é um livro para cromos do Jazz porque as fotografias só tem interesse para quem é doidinho por aqueles músicos (ainda assim dada a má qualidade da reprodução nem sei se satisfaz este público) e o conteúdo escrito é apenas uma simples biografia das façanhas de Mendonça e dos seus projectos sem que haja nada de especial a declarar a nível de histórias milaborantes.
O peso, o luxo e o institucional poderiam ser más características para um livro mas este é o livro institucional no pior sentido da palavra porque foi feito pela própria Câmara, que se calhar sabe passar multas ou atribuir verbas a centros de dia mas não sabe o que é um livro! Se calhar até deveriamos ter pena do designer, coitadinho deve ter sido obrigado a fazer o que lhe pediram... Imagino o Presidente da Câmara (que deverá ser tão ignorante como a maioria dos portugueses em matéria de cultura visual) a dizer "ó David, não se pode ter fotografias a ocupar o livro todo? E se colocasse o título do livro em cabeçalho de todas as páginas? eih? Tá bonito não 'tá? E prateado? Pode-se imprimir em prateado?" Deus nos livre de sermos assim homenageados! É de enfiar o capucho!
Mediocre também é Josephine Baker em Portugal (Casa Sasseti; 2011) também do mesmo autor dos outros dois livros acima referidos. Baker (1906-75) é um ícone do século passado e que passou por Portugal várias vezes entre 1933 e 1960, ora como jet set, ora como artista como ainda como espia para os franceses. A artista nasceu nos EUA mas foi em França que se fez aceite enquanto cidadã negra com o sucesso e "escandale" do mundo do espectáculos, por isso quando a França foi nazificada, além de se ter recusado a tocar durante o regime de Vichy, ao que parece andava a recolher informações nos Casinos portugueses, informações essas que escrevia e colocava no soutien para enviar à malta do De Gaulle - a mim parece-me pouco provável isto, acho que os Senhores da Guerra têm é pancas sexuais maradas e se calhar pediam à "Josefina" esta missão era antes para ter fantasias olfativas-sexuais... Tarado, eu!?
Também se relata outras questões de Baker ter tentado adoptar uma criança portuguesa para a sua Tribo do Arco-Íris, a família de Baker de dez crianças de toda as "raças e religiões", incluíndo por exemplo um coreano, um finlandês, um israelita,... A Madonna e outras "stars" americanas não inventaram nada de novo. O livro é "light" embora seja mal enjorcado com o seu formato estreito. O DVD incluído reúne as gravações sobre as suas passagens em Portugal mas não as actuações da música em 1960 - talvez os "copyrights" fossem altos mas poupando um bocado no papel (formato e qualidade) talvez até se conseguia isso, não? No final, é um simpático documento sobre esta relação portuguesa com a "Vénus Negra" que nunca chegou a fazer "shows" tão provocantes como nas Folies Bergère - não por pudor do nosso terrível catolicismo e Estado Novo mas apenas porque esta grande mulher já estava noutra quando veio cá actuar, o que mostra que Portugal sempre acerta ao lado...
Gracias à Biblioteca de S. Domingos de Rana pelos livros - em especial, claro, pelo primeiro livro que é mesmo uma bela surpresa.
quarta-feira, 21 de maio de 2014
terça-feira, 20 de maio de 2014
LusoSerbiAmerica
E apareceu-me hoje no correio o mítico fanzine norte-americano White Buffalo Gazette com uma BD minha e do sérvio Aleksandar Zograf (autor do Mundos em Segunda Mão) que foi feita em 2003 e publicada originalmente no Talento Local apenas em 2010...
Thanks Buzz & Aleksandar!
sexta-feira, 9 de maio de 2014
quinta-feira, 8 de maio de 2014
terça-feira, 6 de maio de 2014
EGOtripping cara!
A melhor história da edição, porém, fica com o quadrinista português Marcos Farrajota e seu tergiversar free style, altamente ácido, sobre a cultura do punk rock nos dias de hoje. Em cinco páginas, no que parece um surto rabiscado de improviso, ele vai das “demos” podreira (Mukeka de Rato, Leptospirose, DFC, etc.) que recebe pelo correio, à saga de conseguir revendê-las em Portugal, a uma reflexão sobre o solipsismo da cultura punk nos dias de hoje, à comparação entre o som brasileiro e o português, e até a uma árvore genealógica do estilo, partindo de 1976. Finalmente, em talvez um único caso, a música tenha sido relevante na edição “musical” da Prego. O resultado em geral, porém, por irregular que seja, é positivo. Melhor queimar os fusíveis dessa galera de uma vez e deixá-los experimentar do que esperá-los apodrecer procurando fazer obras-primas. por causa do Prego #5!
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