quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Bando de mamados



Eis um bizarro - não são sempre? - disco dos Flaming Lips, banda norte-americana que tinha um cunho "indie" mas que foi para atmosferas sonoras cada vez mais extravagantes, pelo menos para os "índios" comuns e que bateu forte e feio na viragem do milénio com o The Soft Bulletin - vi-os em Paredes de Coura em 2000 e ainda hoje lembro-me da bela experiência que foi! The Flaming Lips and Heavy Fwends (Warner; 2012) é uma compilação de vários discos que eles foram lançando em vários formatos (vulgo, peças de colecção) com "amigos" numa altura que estavam mais ou menos livres de compromissos com a editora. Com VIPs (very importante punks) como Nick Cave ou Lightning Bolt ou VIPS à séria (Kei$a) ou músicos mais sérios (?) (respeitáveis?) tipo Prefuse 73, fazem os temas de "gourmet" Pop/Rock psicadélico que soam sempre mais a FL do que ao convidado ou à fusão dos dois - o caso dos Lightning Bolt é bastante exemplar! Nem sequer é uma coisa nova na carreira deles, considerando a improbabilidade do "remake" do Dark Side of The Moon com o Henry Rollins e Peaches. Ou outros discos clássicos como um dos Beatles com gajo dos Tool e dos Dinosaour Jr e Foxygen. Ou apenas o que já fazem nos seus discos de originais com gente como a Miley Cirus. Quem espera loucura que se acalme, o pós-modernismo está esgotado e não há aqui nada para ficar de boca aberta. As gravações são na base do "envia para cá uns ficheiros" que a gente cozinha isto. Não há encontro de mentes - e sobretudo de corpos - para que os temas rumem para caminhos diferentes pelo confronto físico in loco. É giro, atenção... mas ficamos por aqui, em 2012 já o mundo estava exausto mesmo puxando para títulos de músicas como I'm working at NASA on acid... LOLito

E se parece que estou a dar a ideia que os Flaming são uns betinhos, nada disso, basta lembrar que o Steven Drozd (sempre quis escrever este nome... Drozd! Drozd! Drozd!) teve para ter o seu braço amputado pelo abuso de heroína... E psicadélico por psicadélico ou louco por louco, nada melhor que recordar os que cunharam o termo Rock Psicadélico (em 1966), os 13th Floor Elevators, numa colectânea semi-xunga intitulada His eye is on the Pyramid (Recall 2CD; 1999) que faz um apanhado destes texanos - tudo que é mesmo mamado vem do Texas: Butthole Sufers, Red Krayola,...! E o facto do vocalista ter sofrido electrochoques e tratamentos de clorpromazina no manicómio, para escapar à sentença de 10 de prisão por posse de drogas. Estamos em 1969 e no Texas, estado conservador, enfim, ainda hoje continua a ser uma história triste de como o estado brinca com os nossos corpos e mentes - vale a pena ler A Doutrina de Choque de Naomi Klein ou Os imperativos da Arte de Stefanie Gil FrancoApesar de ter ouvido falar muito na banda nunca tive um disco deles. Lembro-me de ouvir versões de temas deles deles aqui e acolá - Jesus & Mary Chain com Reberveration (doubt) e Butthole Surfers com Earthquake são os que me vêm à cabeça logo à primeira. Esta colectânea é uma manta de retalhos, não indicando de quais dos três álbuns de originais vêm os temas (acho) e há alguns que são ao vivo (que deve ser o quarto disco oficial da banda?). Mas tudo bem, dá para perceber de onde veio muita coisa, do seu legado e é um disco que se ouve bem em casa, mesmo sem LSD na pinha. Não é o psicadélico calmo, trata-se ainda Blues e Rock selvagem - sem o açúcar que viria mais tarde noutras produções, Lips incluídos - mas algum fuzz, sons estranhos e alguma rudeza.

sexta-feira, 24 de novembro de 2023

José António Moura: "Cadernos de Divulgação" (2 vol.; Marte Instantânea; 2023)

 


Há gajinhos espertos e o JAM ganhou esse estatuto com os seus Cadernos de Divulgação (CD), um verdadeiro pot-pourri de informação de como ele consumiu música, aprendeu a apreciar outro tipo de sons e passou a divulgá-los em rádios piratas - isto para já, considerando que a sua futura actividade profissional será de  produtor electrónico e lojista. Dos finais dos anos 70 e em linha recta até aos dias de hoje quem sabe?), se estes CDs forem tão clínicos como têm sido nestes dois primeiros volumes só daqui a 10 é que estaremos em 2023! Mas é justamente o gozo de melómano de ter tanta efémera guardada, de fazer coleccionismo anal retentivo e afins que dá gozo a qualquer nostálgico/ melómano/ antropólogo (riscar o que não interessa) passar por estas folhas em riso com um bom sorriso - a impressão em risografia ou porque é chique ou apenas porque é a única impressão lowcost-DIY que permite ter uma textura que replica a velha fotocopiadora dos anos 80! Há descobertas fixes como Perennial Divide (pré-Meat Beat Manifesto), Princess Tinymeat (com um ex-Virgin Prunes) ou Poésie Noire como parvoíces como Bubblemen Rap (os Love & Rockets a divertirem-se? Que idiotas!), há listas de Top caseiros, há folhas dos programas de rádio, notas de imprensa, memorabilia de bandas, concertos ou discos e textos de reflexão como já pouca gente o faz nos dias de hoje porque já não há imprensa, livros sobre música sempre rarearam no mercado português e os sítios em linha são apenas miseráveis. Cá se espera por mais destes CDs de Marte, ó Major!

PS - sinto, modéstia à parte, que o livro dos 30/20 anos SPH/Thisco tenha sido inspiração prá feituras destes CDs, valeu!!