Quando estive a primeira vez em Valência, durante a mítica turnê da Chili Com Carne, foi impossível não reparar nas paredes da cidade e encontrar pinturas de Escif. Caramba, aquela cidade está cheia delas e mais importante do que isso, topa-se o trabalho dele pelo seu estilo gráfico e pelo conteúdo.
Há muito que a "street art" passou a ser um engodo. Era uma "arte de rua" caracterizada por ser popular (feita por indivíduos sem pretensões artísticas) e marginal (era e é ilegal "sujar" paredes) e que nesta década passou a ser controlada pelo Estado e por companhias comerciais - as que a patrocinam como a usam para vender produtos. Serve na maior parte das vezes para tapar a vergonha que são os edifícios abandonados pela parvoíce capitalista (especulação imobiliária com conivência do poder local) ou para as cidades darem um ar de modernaças e cosmopolitas aos turistas. Vê-se como por exemplo, Lisboa usa esta "arte" dessas duas formas (como aquela merda inacreditável nas Escadinhas de S. Cristóvão) mas em Ponta Delgada, outro exemplo, só a usa para promover turismo tal como recebe lá um Campeonato de Surf qualquer...
O resultado seja como for é o mesmo de sempre: uma arte popular passa a ser feita por "profissionais" e só eles é que tem autorização para fazerem obras. E essas obras para serem aprovadas pelas instituições que pagam aos artistas (e os materiais) acabam por ser "cleans", politicamente inócuas, bem-comportadas e como quase toda a arte contemporânea vigente é "humorística". Pisca o olho ao público para que este pense que é inteligente quando só diz redundâncias ou promove a nostalgia. Pode ser um sapo gigante, os Descobrimentos (só a parte da Glória, nada daquela cena dos negreiros, ok?), um cravo do 25 de Abril e os mais afoitos até escrevem "a revolução qualquer coisa" para parecer que são agitadores do sistema. Uma bosta completa! Não bastava termos TV gigantes nas estradas, outdoors e tanta outra poluição visual e mental, como ainda temos de levar com estes engraçadinhos!
O caso muda de figura com o Escif, mesmo que eu tenha encontrado um catálogo do seu trabalho - comprei ao autor (era mesmo ele?) no último Tenderete - publicado por uma Câmara Municipal espanhola - de Vila-real... Para já o tipo sabe de pintura ou ilustração. É elegante, usa cores que não são histéricas, e o humor dele na realidade é uma mostra da tristeza em que vivemos que oferece mais revolta do que sorrisos. Se pode parecer um paradoxo defender este artista achando os outros uns vendidos, apesar de tudo, o trabalho de Escif é diferente porque não é "espectacular" por isso não fere o olho e a mente. É quase "decorativo", muitas vezes as suas pinturas adaptam-se ao pano de fundo, não o tenta alterar e impor a sua arte, ou seja, o trabalho é subtil e chama a atenção é pela mensagem e não pelas formas que nos ofendem os sentidos. Faz comentário social e político na rua invés de ser num jornal ou noutro mass-media, na essência trata do capitalismo selvagem que nos tem afectado nos últimos anos, desmontando a injustiça do sistema com uma simplicidade igual aos seus desenhos. Não há muitos "artistas de rua" assim, parece-me...
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