As compilações Desert Roses (e outras que aparecem por aí a dizer "isto é música árabe") ora são o puro Orientalismo - segundo a Teoria de Edward Said da forma como o "Ocidente" vê os "orientais" - ou é mandar à favas a todos que esperam essa mesma pureza fantasiada. Esta colectânea é um misto das duas atitudes ao ponto de se encontrar aqui Reggaeton (Tres Mundos), um insuportável italiano fatelo (Piero Esteriore) a usar arabescos ("apropriação cultural" dirão os PCs da vida), metal de videojogo (Baghdad Heavy Metal) ou Reggae (Gnawa Diffusion) em alegre sintonia com a Aldeia Global - se calhar num volume anterior até lá 'tá o Candy Shop do 50 Cent! Este é o quinto volume editado pela CIA (Copeland International Arts) e é de 2007. A maioria das músicas são do Líbano mas há aqui também sons do Egipto e da Argélia, por exemplo, sem que essas fronteiras sonoras sejam identificadas algures no objecto editorial. Obviamente que é mais um disco de capitalização do exótico para se ouvir num bar giro - só não sei bem é aonde... O que vale é que os CDs estão baratos, no meio dos espinhos colhe-se umas rosas, nem que seja porque a "média" desta música do "Oriente" turístico sempre é melhor que a merda do Pop Ocidental...
sexta-feira, 22 de novembro de 2024
As rosas cheiram bem?
As compilações Desert Roses (e outras que aparecem por aí a dizer "isto é música árabe") ora são o puro Orientalismo - segundo a Teoria de Edward Said da forma como o "Ocidente" vê os "orientais" - ou é mandar à favas a todos que esperam essa mesma pureza fantasiada. Esta colectânea é um misto das duas atitudes ao ponto de se encontrar aqui Reggaeton (Tres Mundos), um insuportável italiano fatelo (Piero Esteriore) a usar arabescos ("apropriação cultural" dirão os PCs da vida), metal de videojogo (Baghdad Heavy Metal) ou Reggae (Gnawa Diffusion) em alegre sintonia com a Aldeia Global - se calhar num volume anterior até lá 'tá o Candy Shop do 50 Cent! Este é o quinto volume editado pela CIA (Copeland International Arts) e é de 2007. A maioria das músicas são do Líbano mas há aqui também sons do Egipto e da Argélia, por exemplo, sem que essas fronteiras sonoras sejam identificadas algures no objecto editorial. Obviamente que é mais um disco de capitalização do exótico para se ouvir num bar giro - só não sei bem é aonde... O que vale é que os CDs estão baratos, no meio dos espinhos colhe-se umas rosas, nem que seja porque a "média" desta música do "Oriente" turístico sempre é melhor que a merda do Pop Ocidental...
quarta-feira, 13 de novembro de 2024
Michel Faber : Listen - on music, sound and us (Canongate; 2023)
Foi a Flur que recomendou este livro e ainda bem que caí na esparrela... Só que ainda estou a processar este generoso epitáfio sobre o ideal de consumo da música do século XX. Talvez venha a editar este "post" daqui uns dias...
Faber nem é académico da música (ainda bem) nem é um crítico especialista de música, é "apenas" um escritor que sabe do seu métier para condensar e redigir - mas sobretudo alertar - sobre a maneira como sentimos a música. Do colecionismo em negação - o capítulo em que tenta livrar-se do disco This Inheritance must be refused é hilariante! -, a falocracia em negação que absorvemos seja da Wikipedia seja da imprensa especializada (curiosamente estava a ler o livro quando os escândalos sexuais no Jazz português explodiram), o holiganismo em negação como nos deixamos influenciar pelos outros ou ainda os malefícios da Nostalgia... tema a tema, taco a taco, sem ficarmos a conhecer mais sobre esta ou aquela banda - nem sempre é verdade mas os exemplos são demasiado aleatórios quer para o mau quer para o bom, para que isso seja a essência do livro - ficamos a compreender melhor as nossas escolhas musicais.
Ou pelo menos as dos consumidores anglo-saxónicos. Há música a rodos neste mundo para descobrir sendo uma missão impossível poder ouvir toda a música que existe e que vai existir. Faber diz-nos que não temos de ficar pelos cânones de gajos brancos (e "gajos" significa literalmente mesmo humanos com pénis) e como tal podemo-nos libertar de qualquer pressão de grupo, basta ter curiosidade pelo "outro". Há uma ternura e um humor neste livro que o torna numa mensagem de amor e de esperança para todos os melómanos - e até para os não-melómanos!
PS - ele "trasha" um coche no Henry Rollins que se acha muito esperto. Boa Faber! Nunca curti esse caralho!