quinta-feira, 19 de março de 2015
Paulo Lemos : "Vida Suburbana" (Burra de Milho; 2014)
A melhor cena do livro é quando acaba e é citado o nosso querido Rui Eduardo Paes (in Diário de Lisboa, edição de final de ano de 1984!): Vem aí o século XXI e o terceiro milénio, e lembrem-se: se há punks é porque a rapaziada não é feliz. Parece-me uma frase assertiva para explicar porque a cultura Punk apesar da sua auto-destruição logo à nascença insiste em existir, ora na sua faceta conservadora ora nas suas "n" mutações evolutivas. Passados 40 anos em que a fórmula original está bem morta, esta cultura na sua forma "cristalizada" já não incomoda os conservadores, por isso aparecem os cânones e as oficializações para desinfectar e neutralizar o que o Punk foi, a começar pelos estudos académicos tal como o projecto KISMIF ou este livro de Paulo Lemos que é a sua tese de Mestrado.
Da Academia nada se espera de bom, com os seus processos lentos e de auto-referência e este é mais um exemplo disso. Um livro vindo desse meio consegue sempre a proeza de não aquecer nem arrefecer. E talvez porque o autor tem uma banda Hardcore chamada Resposta Simples felizmente até conseguiu fazer um livro... simples!
A favor é que não entrou no esquema da lista completista para cromos baterem punhetas com as suas colecções discográficas e memorabilia mercantilista, nem mata ninguém de tédio. Porquê? Porque o seu academismo é... simples!
Com uma ponta de pretensiosismo saudável queria ser o primeiro livro sobre o Punk português, tudo bem formalmente conseguiu fazer isso mas como não conta nada de novo, ou de interessante ou de picaresco (em relação a outros escritos espalhados em livros, revistas e jornais) é apenas uma vitória "formal".
Este livro é bom resumo ou um "1-0-1" sobre o que é o Punk, o Punk português e a banda Mata-Ratos. Até o título está deslocado do conteúdo: Vida Suburbana? Aonde? Não há biografias nem estudos sobre essa "vida suburbana" e como isso afecta a cultura Punk - ao contrário deste zine que parece contar na realidade tudo o que se precisa mesmo saber do Punk em Portugal nos anos 90. Parece que foi uma forma (simples) do autor não meter um título "à la" Universidade como Punk Português para Principiantes, seguido de Estudo do Agrupamento Mata-Ratos, que seria um título mais honesto dada à sua completa falta de risco intelectual. Não deixa de ser uma reportagem bem feita que poderia estar publicada num semanário mas até no jornalismo seco dos dias de hoje seria preciso despertar a curiosidade ao leitor ou analisar o "fenómeno" de uma forma inédita e/ou cativante. No fundo este trabalho vai a favor da maré das milhares de teses da treta que se produzem todos os anos na Universidade, até em Coimbra, essa "Cidade do Conhecimento" (pfff!) onde foi redigida a tese.
E invés dela ter ficado no Arquivo Morto da Universidade ao menos foi publicada para qualquer um a poder ler, sem envergonhar ninguém porque é coerente no seu restrito espaço de investigação e não se espalha como os outros livros de Pop/Rock feitos por coleccionadores e crominhos.
O Design é... é... é simples! O tamanho da letra é demasiado minúscula para que os Punks velhos não possam ler o livro e resmungar - é uma forma de os desarmar? O preço é "true" Punk: 7,57€ (mas não é simples!); o que é de salutar dada ao exagero dos preços do mercado livreiro. Tal como o livro do Dico foi uma "oportunidade perdida" este também sofre disso. Mais sobre estes temas (o Underground, o Metal, o Punk, o Industrial, o Noise, o Indie, bla bla bla) irão aparecer no futuro, até com melhores resultados, sendo que estes documentos (simples) irão servir de base... de copos.
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