quinta-feira, 27 de março de 2025

Adalberto Alves : "Arabesco : da Música Árabe e da Música Portuguesa" (Assírio & Alvim; 1989)

 Há livros que nos mudam para sempre. Este simples ensaio sobre as possíveis ligações da música portuguesa com a árabe poderá ser visto como um livro para melómanos tarados ou algum musicólogo com tendências etnográficas. Certo certíssimo! Talvez até o seja embora como admita desde logo que é apenas um pequeno contributo para tal.

Eu cá não percebo nada de instrumentos nem de notas, pautas, etc... E o livro fala disso também. O mais importante nem é isso, é o fascinante explanar de que a cultura árabe sempre fez parte do ADN português - péssima altura para ser neonazi! - muito mais do que se pensava, ou pelo menos o que nos ensinaram na escola. Agora percebo porque somos como somos, realmente nada temos em comum com os babacas da Europa do Norte. A nossa relação com os Mouros não foi de porrada neles e pô-los fora da Península. Houve negócio, houve cortes misturadas, havia fascínio pela música e cultura árabe porque na altura a cultura árabe era superior, houve parcerias entre os dois povos (três se contarmos com os Judeus). Os árabes estiveram séculos na Península antes da "reconquista". Moravam cá, copulavam como qualquer outro mamífero, constituíram famílias e tudo o mais que é normal numa civilização colonial. Como só no século XX é que se inventaram aquelas ideias funcionais como campos de extermínio, a questão é: depois dos "Afonsinhos do Condado" terem conquistado este rectângulo para onde raios foram parar todos Mouros que viviam cá?

Integraram-se, cristianizaram-se quando havia maior pressão católica, e só muito mais tarde os que não conseguiram apagar o rasto religioso é que foram apagados pela barbárie da Inquisição. Ou seja houve desta gente até muito mais tarde do que foi considerado com a terra conquistada e com bandeirinha portuguesa espetada. Significa que o nosso espírito está mais no Magrebe que em Roma e que estamos mais virados para o Oriente do que prá Cruz! Não admira que passamos sempre tristonhos e no canto da "saudade" - deve ser saudades das Mil e Uma Noites que perdemos graças à tirania cristã e à sua falta de imaginação monoteísta.

No fundo sabemos que algo está mal na nosso modo de ser. Algo foi imposto, não é suposto sermos assim, cristãos! Bem, ninguém deveria ser cristão para dizer a verdade mas falando só de Portugal, o que acontece é que não nos damos bem com a batuta da civilização europeia - aliás, os europeus do Norte tem a mania de dizer que Portugal é onde começa África. Eles tem razão!!! Somos tão estúpidos como os cabo-verdianos (que acham que são europeus!) por não assumirmos o outro continente, o africano. Realmente num país que todos devem a todos, que passa a vida a tentar a dar voltas ao sistema, que gosta de receber, de conversar e de conviver, que é hospitaleiro e de vida despreocupada, não são características bem sintonizadas com os tecno-protestante do Norte. Sempre senti que "o meu coração era árabe", agora tenho a certeza.

PS - o texto foi escrito em 2011 e fui repescá-lo porque além de não sentir vergonha dele, aconteceu-me aquilo que acontece quando se fica "velho". Com 51 anos, em Dezembro do ano passado comprei uma nova edição deste livro, pela Althum em 2016. Ia jurar que já o tinha ou que já o tinha lido ou... enfim, memória o que andas a fazer!? Mal não fez até porque a edição da Assírio já estava bem estragada e com traços de humidade. E foi um prazer reler este livro, relembrar que a Amália ("voz de todos nós") Rodrigues admitia que "A Oum Kalsum foi a melhor cantora que ouvi até hoje..." e ir procurar a discografia recomendada por Alves. Agora, só falta descobrir o que fiz aos Cadernos de Divulgação que não os encontro em casa!

terça-feira, 25 de março de 2025

25

 

- Fabrice Neaud :  Le Dernier Sergent vol. 1 : Les Guerres Immobiles (Delcourt; 2023) + Nu-Men (Soleil; 2012-13)

- Rudolfo : Fusão Dimensional : A Ascensão do Governo Sombra (Palpable Press)

- Sherill Tippins : Inside the Dream Palace - The life and Times of New York's Legendary Chelsea Hotel (Simon & Schuster; 2013)

- Shintaro Kago : Parasitic City #0, 1, 2 (Hollow Press; 2022-24)

- Joe Sacco : War on Gaza (Fantagraphics; 2024)

- Martin Dupont : Hot Paradox (Infrastition; 2011 - orig. 1987) + Just because... (Infrastition; 2011 - orig. 1984)

- DJ Bali : Scrap Vinyl (Vinilificio; 2024)

- Queimada + Spitgod (Vortex; 15.03)

- Marie-Claude Treilhou : Simone Barbes ou la Vertu (1980)

- Daniel Lukes & Stanimir Panayotov : Black Metal Rainbows (PM Press; 2023)

- Yoshiharu Tsuge : Oba Electroplating Factory (Drawn & Quarterly; 2024)

- Rodolfo Mariano : Questmaster (Ao Norte)

- Sidney Lumet : Serpico (1973)

- Roxy Music : For your Pleasure (Island; 1973)

- Stefan Golaszewski : Mariage / Casamento (2022)

- Natsuko Ishitsuyo : Magician A (BDP; 2020 - orig. 2017)

- José Bártolo & Jorge Silva : Para ser eterno basta ser um livro - editorial e design do livro em Portugal no século XX (ESAD; 2024)

- Studio One Groups (Soul Jazz; 2006)

- Ilan Manouach : Tarwar (Echo Chamber)

- Joel & Ethan Cohen : A serious man / Um homem sério (2009)

- Henri-Georges Clouzot : Les Diaboliques (1955)

- Dillon Mapletof & Oliver Taylor : Everyone Else Burns (2023-24)

- Viljar Bøe : Good Boy (2022)

- Louise Michel : De Luto em Luta (Barrica de Livros; 2023)

Geir Henning Hopland : Headhunters / Caça-Talentos (2022)

segunda-feira, 10 de março de 2025

Merda Frita 3

 

Graças ao José Feitor - então ao editor do fanzine Merda Frita Mensal - fiquei a saber do seu lançamento... enfim, putos!

Aqui está a mensagem: Fruto de sinergia marada entre decanos (Imprensa Canalha) e jovens militantes do mau gosto (Matilde Feitor e meliantes da Merda Frita), anuncia-se evento apocalíptico no dia 15 de Março, a partir das 18h30, nos novos aposentos da Oficina do Cego (Estrada de Chelas 101, Lisboa - Espaços da Gráfica Municipal).

Serão apresentados ao público incauto as seguintes pérolas:

Fosso #3 (José Feitor, Imprensa Canalha)

Merda Frita #3 (Merda Frita Lda)

Fora de Campo #2, Night Time, My Time, Contos do Mar (Bancarr0ta, Matilde Feitor)

Haverá ainda exposição de originais de José Feitor para o Fosso e impressão serigráfica dos postais que acompanham a edição.

Comes e bebes assegurados pela Oficina, conversa a expensas dos ilustres autores e seus convidados.

sexta-feira, 7 de março de 2025

Propaganda

 


Propaganda

de 

Joana Estrela

 

21º volume da Mercantologia, colecção dedicada à reedição de material perdido do mundo dos zines. Editado por Marcos Farrajota e publicado pela Associação Chili Com Carne no âmbito da comemoração da primeira edição desta obra, lançada originalmente pela Plana Press em 2014

A edição teve uma reedição pela autora, ambas redigidas em inglês. 

...

O design do livro foi replicado da edição original desenhada por Luís Camanho e Ana Isabel Carvalho.

CHEGARAM HOJE 500 exemplares!

Já se encontram na Kingpin e Snob...


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A melhor sinopse foi feita por ti, perto do fim do livro: a pessoa que
não sabe o que dizer tem uma t-shirt que diz por ela «I Survived Baltic
Pride 2013». Melhor para mim, então, que já não tenho de o resumir, até
porque um livro de 2014 reeditado em 2025 traz com ele mais história do
que apenas a do ano letivo de voluntariado na Lithuanian Gay League.

Do ativismo, como não raro de eventos culturais, só tende a ficar uma
vaga memória coletiva ou, pior, uma frase numa cronologia. Lembramo-nos
dos anos, das causas e das grandes conquistas, quando as há, mas não do
cartaz que desenhaste ou das reuniões noite dentro. A não ser, claro, na
história oral das pessoas envolvidas. Quantas feiras de livros e
exposições e ciclos de cinema e conversas e grupos mais ou menos
informais se vão fazendo e desfazendo ao longo dos anos, como uma linha
descontínua da energia que cada pessoa a cada momento conseguiu dar? É
que, como sublinhas aqui, a história do movimento é a história de quem
faz o movimento. E a história é lenta.

Quando voltas a Vilnius para apresentar o Propaganda, na sua versão
original em inglês pela Plana Press, fazem-te uma entrevista para o site
da LGL. Perguntam-te sobre literatura portuguesa e ativismo LGBTQ. Entre
outras coisas, respondes que «this is the first comic book that is more
specific on the subject to be published in Portugal». Uma década depois,
isto ainda é verdade.

domingo, 23 de fevereiro de 2025

Bosta, Merdina e Moerdas: obrigado!

 


Incrível como uma música dos Mão Morta de 1992 nunca esteve tão actual:

https://www.rtp.pt/play/p14349/e824909/linha-da-frente


sábado, 22 de fevereiro de 2025

M.A.L.



M.A.L.

de 

Rodolfo Mariano

 

é o 20º volume da Mercantologia, colecção dedicada à reedição de material perdido no mundo dos fanzines.

M.A.L. é uma série de banda desenhada que foi desenvolvida durante o Verão de 2019 através de um exercício criativo de produção diário e respectiva publicação em lightninrods.tumblr.com. Entre 2019 e 2021 foram impressos três números da série em formato fanzine. Encontra-se aqui uma selecção das melhores bandas desenhadas da série.

Foram impressos 500 exemplares, 80p 16,5x23cm p/b, capa dura em geltex 

já está disponível na nossa loja em linha e na Almedina, BdMania, Cult, Kingpin, Linha de Sombra, Matéria Prima, Snob, SocorroSTET, Tigre de Papel, Tinta nos Nervos, Velhotes, Mundo Fantasma e ZDB. Brevemente na Eventual (Espanha).

 


 

Rodolfo Mariano é um dos artistas mais produtivos na actual BD portuguesa - quem desconfiar que pegue na máquina do tempo e vá visitar a suas exposições retrospectivas no Festival de Beja em 2022 ou a Horror Vacui - gastará menos gasosa espácio-temporal porque foi só em Fevereiro de 2024, ufa! Uma afirmação destas pode dizer nada ou tanto como o Maior Colecionador de Guitarras da Tâsmânia, claro, mas será cego quem não tem acompanhado o seu trabalho e reparado nos saltos qualitativos cada vez que aparece uma nova produção sua. E mais! Eis um autor que tem mil mundos lá dentro dele para nos contar "coisas". É raro ver um só indivíduo que desenha de puta madre e ainda tem "cenas" para dizer! Ainda por cima diz tanto numa única página!! Acreditem, amiguinhos da Chili, cada página de Maldito Aquele Lugar é um Haiku perfeito. Ou uma bomba de ansiedade. Ou um gatilho para um Fantasia. Ou um Sonho capturado de outro ser noutra dimensão. Ou... 

Para apaixonados da Krazy Kat, do Heavy Metal, da Interzona, dos Fofinhos da Mariana Pita, da vida pós-boémia e do Capeta. Nada dura para sempre.



Sinopse:  

Há um lugar no Necroverso onde o Tempo parece não avançar nem recuar. Entre a ascensão e a queda do Sarcoliberalismo Galáctico, a vida vivida aos soluços em retrospectiva parecia não ter sido assim tão má. Não fora essa mesma vida tão desesperantemente longa e desencantada pelos efeitos soporíferos de um feitiço despótico ritualizado em segredo pelos Necroeconomantes da Maldade Eterna ao longo de incontáveis eras. M.A.L. ou Maldito Aquele Lugar situa-se nas entrelinhas das histórias aos quadradinhos passadas na Terra Intermédia, território diegético entre os paraversos Cemitéria e Vomitória.




Rodolfo Mariano (1981; Coimbra) artista visual independente, músico de rua improvisador de paisagens montanhosas subaquáticas, contador de histórias estranhas em quadradinhos, criador editor de livros efémeros e entusiasta de pequenas movidas paralelas esquisitas. Autor de Bottoms Up, participante assíduo na revista Pentângulo e do jornal Carne para Canhão, professor ocasional na escola Ar.Co. e colaborador regular das antologias da Chili Com Carne. Vive e trabalha entre Lisboa e Coimbra ao leme do barco fantasma perpetuamente encalhado em terra de ninguém, o atelier ABRACADABRA.


 Livros disponíveis:

Bottoms Up (Chili Com Carne; 2020) - vendedor do concurso "Toma lá 500 paus e faz uma BD" 2020

(antologias:)

Conger Conger Comix (co-editado com Agenda Yuzin; 2022)

Massa Crítica (2024)

Pentângulo #2, 3, 4, 5 (co-editadas com escola Ar.Co.; 2018-2025)



HISTORIAL

Lançado oficialmente dia 22 de Fevereiro no Vortex, Lisboa com conversa com o autor e DJing com Eyes of Madness e Katyusha

...

 

 

terça-feira, 31 de dezembro de 2024

24h


- Ruben Östlund : Triângulo da Tristeza / Triangle of Sadness (2022)

- Thierry Van Hasselt : La Véritable Histoire de Saint-Nicolas (Frémok; 2023)

- Stefan Zweig : Castélio contra Calvino ou uma consciência contra a violência (Assírio & Alvim; 2023 - orig. 1936) 

- João Abel Manta : Livre (Palácio Anjos, Algés) + Laurent Filipe : A Torre de João Abel Manta : O Imaginador (RTP)

- Imai Arata : Flashpoint (Glacier Bay)

- Will Self : The Butt (Bloombury; 2008) 

- Michel Faber : Listen - on music, sound and us (Canongate; 2023) + O Livro das Estranhas Coisas Novas (Relógio D'Água; 2015 - orig. 2014) + Debaixo da Pele (Difel; 2001 - orig.: 2000)

- Ryszard Kapuscinski : Ébano (Livros do Brasil; 2020 - orig. 1998)

- Marc Torices : La alegre vida del triste perro Cornelius (Apa Apa; 2023) 

- Octopoulpe (19 Maio; Disgraça)

- Krypto (2 Novembro; SMUP)

- Chris Oliveros : Are you willing to die for the cause? (Drawn & Quartely)

- Saeed Roustayi : Os irmãos de Leila (2022) 
 
- Anthony Burgess : 1985 (Arrow Books; 1980 - orig. 1978)
- Deborah Shamoon : Passionate Friendship - The Aesthetics of the Girl's Culture in Japan (University of Hawai'i Press; 2012)
- Claire Barel-Moisan & Matthieu Letourneux : Albert Robida - De la satire à l'anticipation (Les Impressions Nouvelles; 2022)
- Evin Collis : Litterpig (4 vol.; ed. de autor; 2020-24) + Transcontinental (3 vol.; ed. de autor; 2016-18)
- Jeanne Waltz : Vento assobiando nas gruas (2023?)
- Bruno Dumont : O Pequeno Quinquin / P'tit Quinquin (2014)
- Beth de Araújo : Soft & Quiet / Suaves e Silenciosas (2022)
- Erica Couto-Ferreira : Corpos : As outras vidas do cadáver (Faktoría K / Kalandraka (2023)
- Simone Weil : Reflexões sobre as causas da Liberdade e da Opressão Social (A Bela e o Monstro / Rapsódia Final; 2022 - orig. 1943)
- Andrew Nette & Iain McIntyre [ed.] : Dangerous Visons and New Worlds : Radical Science Fiction, 1950-1985 (PM Press; 2021)

quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Merda Frita



Há por aí todo um fascínio pelo Japão e pela sua cultura. Fascínio esse perigoso se não tivermos um posicionamento crítico sobre aquela sociedade e o seu Estado. Os Mangás e Animes aparecem como uma fofura para a juventude e sobretudo faz parte de um “softpower” que nos fazem esquecer que o país é racista e xenófobo – curiosa a série de TV Tokyo Vice, um “neo-noir” que mostra como é tratado um “gaijin”. Seja como for isto são notícias antigas, a cultura Pop da Coreia do Sul está a ser a nova coqueluche cultural nestes tempos. E talvez seja mesmo o fim da linha para o Japão, que tinha o prenúncio em 2013 quando apareceu um CD que juntava as BiS com os Hijohkaidan.

As BiS (Brand-new Idol Society) é uma banda “idol”, aliás, elas são “alternative idol” se nos quisermos rir ainda mais. O fenómeno “idol” surge no Japão nos anos 60 e mete umas caras larocas a cantar, dançar e a venderem iogurtes ou merda frita. A coisa foi evoluindo ao ponto de serem também bandas de miúdas – tipo Spice Girls mas mais mecânico, histriónico e foleiro. As BiS romperam um coche a foleirada ao misturarem outros sons e temas dentro desta cena de bonecas biónicas, daí “o alternative”. Aliás, foi graças a esse rompimento que apareceu também o Kawaii Metal – com as Babymetal como a grande referência, e sim, é J-Pop com Metal à la Slipknot.

Os Hijohkaidan são da primeira geração de músicos Japanoise – termo ambíguo que tanto quer dizer que são artistas que fazem música com objectos não-musicais amplificados, ruído electrónico, buscas cósmicas (vindo do grande fascínio japonês pelo Prog e psicadélico), o grito punk “um dois três quatro” para depois ouvir-se um gajo a defecar, performers que atirarem sacos de urina ao público, um bulldozer em palco (o concerto de Hanatarash acaba quando este está para atirar um cocktail molotov aceso para o palco), etc… Extremismos vários que tornaram míticos projectos como  Boredoms, C.C.C.C., Incapacitants, KK Null, Gerogerigegege, Ruins e claro o grande deus Merzbow.

Não faço puto ideia quem é que se lembrou de juntar os géneros Idol e Noise, parece mesmo aquelas parcerias de bandas rock decadentes ocidentais em que tens de meter um miúdo novo do Trap que esteja em grande para que continues relevante nos tops e social-media. Só aqui o estranho é que imagino que no Japão ninguém queira saber dos Hijohkaidan, mesmo que tenham uma carreira de terrorismo sónico desde 1979, e prás BiS tenha servido para queimar carreira. Não será assim, claro, como irão ler a seguir… até porque foi editado numa empresa enorme, por isso, já sabem do cliché de que o capitalismo absorve tudo, até Noise!

Assim temos um CD intitulado Bis Kaidan, 27 minutos de som, elas a cantarem aquelas vozinhas irritantes híper-coreografadas – mas também muitas vezes a gritarem como umas desalmadas ou para megafones – com batidas de dance-teen-pop-anime. Por detrás, ouve-se ruído puro do trio de velhinhos (há uma mulher na formação, by the way!) empenhados em fazer disto uma experiência ainda insuportável que o normal. Tudo é errático e caótico, guitarras com feedback e barulho digital. O CD traz uma fotografia como extra de uma das seis BiS, talvez para colecionar e arranjar autógrafo, sei lá…

E se isto deveria ser um disco único para melómanos e amantes do Pop bizarro, a coisa não ficou por aqui. Houve concertos e um disco ao vivo de despedida: 2014.5.6 BiS階段 Last Gig @ WWW. Um duplo CD, cujo livrinho tem fotos dos concertos – é hilariante ver as miúdas ensanguentadas vestidas de fato de colégio com tripas de fora e a fazerem, acho eu, um pacto de suicídio colectivo - o pior “bizness” de sempre como toda a gente sabe. O primeiro CD é absolutamente insuportável, o tema nerve é repetido 13 vezes, como uma performance de endurance (para todos! Público e músicos) em que vamos ouvindo um tema especialmente fofinho irritante “em loop” durante 50 e tal minutos creio, não tenho coragem de voltar a por o disco nem para ver esta informação tão relevante para este artigo. Por detrás, mais uma vez, os Kaidan a fazer barulho! O segundo disco já são vários temas do disco original, menos mal. Mas sim fiquemos pelo disco original, evitem o “ao vivo”, para vossa sanidade mental. Por outro lado, pode ser uma boa forma de desmame e desintoxicação da cultura nipónica!

Artigo publicado na Merda Frita Mensal #2

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Mais uma pró currículo!


 

Pelos vistos vou participar disto, ainda bem que recebo emails divulgativos da Zaratan...

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

As rosas cheiram bem?




As compilações Desert Roses (e outras que aparecem por aí a dizer "isto é música árabe") ora são o puro Orientalismo - segundo a Teoria de Edward Said da forma como o "Ocidente" vê os "orientais" - ou é mandar à favas a todos que esperam essa mesma pureza fantasiada. Esta colectânea é um misto das duas atitudes ao ponto de se encontrar aqui Reggaeton (Tres Mundos), um insuportável italiano fatelo (Piero Esteriore) a usar arabescos ("apropriação cultural" dirão os PCs da vida), metal de videojogo (Baghdad Heavy Metal) ou Reggae (Gnawa Diffusion) em alegre sintonia com a Aldeia Global - se calhar num volume anterior até lá 'tá o Candy Shop do 50 Cent! Este é o quinto volume editado pela CIA (Copeland International Arts) e é de 2007. A maioria das músicas são do Líbano mas há aqui também sons do Egipto e da Argélia, por exemplo, sem que essas fronteiras sonoras sejam identificadas algures no objecto editorial. Obviamente que é mais um disco de capitalização do exótico para se ouvir num bar giro - só não sei bem é aonde... O que vale é que os CDs estão baratos, no meio dos espinhos colhe-se umas rosas, nem que seja porque a "média" desta música do "Oriente" turístico sempre é melhor que a merda do Pop Ocidental...

La Légende Du Raï, vol. 1 (The Intense Music; 2003) é uma colectânea manhosa que se calhar deve ser vendida nas autoroutes francesas, tanto que outros volumes da "colecção" inclui outras antologias "best of" de Chales Aznavour, "stars des sixties", Edith Piaf e outras situações que não consigo identificar nem me interessa... O Raï é um estilo de Pop da Argélia, muitas vezes perseguido pelo Estado e senhores da moral mas que devido à sua popularidade não conseguem abafar. Não creio que falem de política directamente mas já sabemos que os ditadores do mundo não curtem nada sensualidade do amor. Não percebendo as letras fica uma impressão de uma música popular - em que os sintetizadores trouxeram uma universalidade seja no mundo árabe, Cabo Verde, Portugal ou Balcãs, vai-se lá explicar, ou então a família humana tem menos diferenças que os nacionalistas nos impingem! - entre vozes sofridas (de amor? luxúria?), algum trolóló funky (amor conquistado?), alguma intoxicação sonora (?), vozes masculinas, vozes femininas, vozes de crianças (?), alguns stars (com centenas de k7s editadas como o Khaled, quem? Bom, o gajo até aparece duas vezes neste CD, por isso, respeitinho!) e outros nada conhecidos (cóf cóf cóf). Um argelino poderá ficar tão fascinado com um disco de Pimba que apanhasse numa gasolineira na A22. Embora o Raï tenha mais pathos e instrumentais mais bonitos.

quarta-feira, 13 de novembro de 2024

Michel Faber : Listen - on music, sound and us (Canongate; 2023)

Foi a Flur que recomendou este livro e ainda bem que caí na esparrela... Só que ainda estou a processar este generoso epitáfio sobre o ideal de consumo da música do século XX. Talvez venha a editar este "post" daqui uns dias...

Faber nem é académico da música (ainda bem) nem é um crítico especialista de música, é "apenas" um escritor que sabe do seu métier para condensar e redigir - mas sobretudo alertar - sobre a maneira como sentimos a música. Do colecionismo em negação - o capítulo em que tenta livrar-se do disco This Inheritance must be refused é hilariante! -, a falocracia em negação que absorvemos seja da Wikipedia seja da imprensa especializada (curiosamente estava a ler o livro quando os escândalos sexuais no Jazz português explodiram), o holiganismo em negação como nos deixamos influenciar pelos outros ou ainda os malefícios da Nostalgia... tema a tema, taco a taco, sem ficarmos a conhecer mais sobre esta ou aquela banda - nem sempre é verdade mas os exemplos são demasiado aleatórios quer para o mau quer para o bom, para que isso seja a essência do livro - ficamos a compreender melhor as nossas escolhas musicais. 

Ou pelo menos as dos consumidores anglo-saxónicos. Há música a rodos neste mundo para descobrir sendo uma missão impossível poder ouvir toda a música que existe e que vai existir. Faber diz-nos que não temos de ficar pelos cânones de gajos brancos (e "gajos" significa literalmente mesmo humanos com pénis) e como tal podemo-nos libertar de qualquer pressão de grupo, basta ter curiosidade pelo "outro". Há uma ternura e um humor neste livro que o torna numa mensagem de amor e de esperança para todos os melómanos - e até para os não-melómanos!

 PS - ele "trasha" um coche no Henry Rollins que se acha muito esperto. Boa Faber! Nunca curti esse caralho!

quinta-feira, 19 de setembro de 2024

El Brujo está morto, viva El Brujo!


Ainda só no outro dia soube da morte do Pinche Peach e ontem morreu o Brujo! 
Brujeria No Más! 

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Deste vez é mesmo aqui ao lado...

 


Acontece no dia 14 de Setembro, às 15h30, na Casa da Achada uma conversa com Marcos Farrajota (mais uma vez) sobre Carlos Botelho, no âmbito da exposição A vida sem palavras.

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Brix Smith Start : Rhe Rise, The Fall, and the Rise (Faber & Faber; 2016)

 Verão e biografias de roqueiros e outros loucos relacionados. I love it! Total sucker! E saiu-me esta Brix - nome vindo pelo seu amor (partilho o mesmo) pelo tema Guns of Brixton dos Clash, e da música punk e post-punk britânica.

Princesinha californiana que foi parar ao pesadelo do proletário inglês e as suas morcelas, Brix é daquelas figuras que teve mais vidas que um gato e cujas relações ultrapassam os famosos "seis graus de separação". Rodeada por uma família disfuncional, com problemas de auto-estima (que inclui bulimia e anorexia), abusada sexualmente (esse desporto nacional dos EUA - perdoem-me a piada mas é uma nação culturalmente baseada em "rape culture" e já não há paciência para o que se passa por lá até as mulheres americanas tomarem os ensinamentos de Solanas e Bobbitt de vez) e que conheceu, apaixonou-se e casou-se (e divorciou-se) do Mark E. Smith (1957-2018) dos The Fall
 
A única coisa de boa que este peido velho (e morto) de Manchester foi de lhe dar (e tirar) confiança para investir na música - ao que parece ela fez parte de um período dourado dos The Fall, entre 1983 e 1989 mas sinceramente não faço mínima, nunca foi banda que me tivesse interessado. Confiança que esgotou a dada altura, tendo-se dedicada à moda desde 2002. Entretanto desde 2016 que voltou com bandas suas que ainda não tive tempo para ouvir.
 
Sincera - como é normal nestas obras autobiográficas - sem filtros, sem ser ordinária a lavar roupa suja ou à procura de vingança barata, eis um livro perfeito para as férias ou para os transportes públicos de regresso ao trabalho. Só digo mais isto, Brix ainda teve relações com o Rato Mickey (shit you not!) e o foleiro Nigel Kennedy. Os seis graus vão ainda às Bangles e Hole... e Donovan! Ufa! Intenso! Aliás, intensa!

Uma nota final: no sítio da Faber atrevem-se a dizer que The Fall foi "most powerful and influential anti-authoritarian postpunk band in the world"... WTF!? Anti-autoritária? Toda gente sabe, e não é preciso ler este livro, para saber que Smith era um filho da puta de primeira! E autoritário! JIIsus fuck! Pelo som da banda parecer tão "free form", lembra o que escreveu em tempos o Rui Eduardo Paes sobre Sun Ra, Zappa, Kuti e Captain Beafheart que também pareciam todos estes líderes de bandas (e a palavra "líder" não engana) uns grandas malucos, anarquistas, improvisadores sem hierarquias mas são sabidas as histórias como todos estes gajos despediam, torturavam, abandonavam nas estradas estrangeiras das tournês e oprimiam os seus "colegas" músicos. Está tudo louco!

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

100 Trabalho


Esqueci-me de anunciar esta exposição em que participei com uma velharia do Talento Local... Entretanto esta nova fica já aqui assente, o novo projecto do australiano Michael Fikaris Human Work. + info: aqui 


segunda-feira, 22 de julho de 2024

Vaidade anarquista

Referem a minha tira Centro Anarquista Português de Artes Modestas - mais tarde mudado para Centro Anarquista Internacional de Artes Modestas - neste livro dos 50 anos d'A Batalha recuperada pós-25 de Abril. Dizem que é um belo nome mas escapa "anarquista" na referência do livro. LOL

sexta-feira, 12 de julho de 2024

'Tou na Merda


Finalmente a chavalada do fanzine Merda Frita Mensal passou ao titio Farrajota o número 2 em que participo com um texto sobre Japanoise. Num mundo divido em velhos que voltam a fazer zines sem interesse nenhum porque há realmente uma certa atitude para fazer este tipo de publicações e um mundo de miúdos empreendores higiénicos que se chateiam na 'net, esta Merda é antítese disto tudo: livre, provocador xixi-cócó, quesafoda-o-mundo... Um bocado solipsista natural da idade, é um fanzine porreiro mas que é merda.

Acho que se pode pedir práui: merdafrita89@gmail.com - 89?

quarta-feira, 26 de junho de 2024

alt-Nunsky

Nunsky é entrevistado no H-alt. Entretanto raptaram aqui uma prancha da estreia do artista no Mesinha de Cabeceira #4 (1994) antes de um verdadeiro Nazi Skins Massacre!!!!!