quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Gémeos falsos


Ragga Twins: "Step out"
v/a: "Steppas’ Delight - Dubstep Present To Future"
(Soul Jazz / Sabotage; 2008)

Não há editora de música que relembre e respeite mais a música "Black" que a Soul Jazz... Se foram os discos de Reggae e Dancehall que lhe deram mais projecção, será injusto não referir às compilações ou reedições de discos de Funk ("über-cool" a recente colectânea New Orleans Funk : The Original Sound of Funk : Volume 2, que merecia um artigo só para ele), ritmos afro-cubanos (interessante o disco Tumba Francesa — Afro-Cuban Music From The Roots) e Voodoo, Disco, Soul (investiguem a compilação de singles das Sisters Love, Give me your love) mas também outras "danças" inesperadas como o Post Punk e No Wave, Tropicália e música electrónica em geral.
Não se sabe se é a Soul Jazz que controla o mundo ou se ela rege-se pelas modas mas cada vez que a editora pega em algo perdido na história da música urbana moderna, de repente parece que ela está a dar. Pelo menos é o que parece... quando pegaram no Acid e de repente ia jurar que o Acid tinha voltado. E se neste Novo Milénio, ou pelos menos nestes anos zero, parece que a recriação e revivalismo estão na ordem do dia, e se o Jungle parece que está aí outra vez, a Soul Jazz tinha de nos trazer tesouro cheio de singles e máxis raros dos Ragga Twins, que nos inícios dos anos 90, juntamente com os produtores Shut Up and Dance criaram a ponte entre o Reggae e o Hip Hop, o Jungle - e em paralelo e derivação o Drum'n'Bass, UK Garage, Dubstep, Grime,... Ouvi-los nos dias de hoje soa algo estranho porque o som é baço e naíf - quase que se já se pode falar em "e-vintage de estado 808" - o que poderá fazer delícias aos "e-nostálgicos". As vozes acabam por sobresair em excesso enquanto debitam "raggas"sobre a cena Rave e o clima social britânico da altura - que de alguma forma não é muito diferente dos dias de hoje.
CD ou LP duplo, Steppas' delight, ao que parece é uma edição de luxo para quem quiser saber o que é o Dubstep - digo «ao que parece» porque o que tenho são CD's promocionais sem as fotografias e textos que costumam acompanhar as edições da Souljazz, ficando reduzido ao acesso à música e à nota de imprensa. O problema dos promocionais é que estão com as faixas trocadas em relação às edições oficiais sendo um bocado labiríntico analisar a "coisa" - por outro lado, não é o propósito do Dub baralhar os sentidos para entrarmos "algures" noutra dimensão?
Claramente existe um fosso entre os "cromos" e os "novatos" que são separados pelos discos, sendo o primeiro melhor que o segundo devido à "creme de la creme" do Dubstep que o compõe, como os conhecidos Kode 9, Benga e The Bug (este último, aproveito para avisar que deve ser um dos melhores músicos deste início de Milénio). Juntamente com Shackleton e Search and Destroy tecem as barreiras deste (sub)género musical inventado no sul de Londres. E se a proposta da compilação é apontar futuros possíveis para o Dubstep, no primeiro disco já são feitos pequenos desvios-padrões com Unkle Sam (próximo do Reggae), TRG (quase Techno Minimal) e Seventeen Evergreen (quase que próximo de Rave). Ou Plastician que juntamente com Gatekeeper (no segundo disco) juntam o Grime à colecção.
É no segundo disco onde impera mais "confusão" - apesar da inclusão de "standards" como Ikonika e Shonk - indo para novas lóagicas como o do Hip-Hop (Joker), aquela mixórdia que foi Kruder & Dorfmaster - Vade de retro satanas não estamos nessa! - por Martyn, House-qualquer-coisa-merdosa de Geiom (c/ Marita) ou de Silkie, a natural perversão do Dub tradicional por Peverelist... enfim nada de Futuro muito radiante, diga-se.
A excepção deste disco passa por Gothtrad, o melhor do segundo disco, uma percurssão meta-espacial de assustar até os mais sóbrios, na direcção do Dub Industrial... mas espera, na edição ao público esta faixa está no primeiro disco! Hum... parece-me que quem tiver a edição normal poderá ficar com o primeiro disco e despachar o segundo. Ou então comprar a "colecção" Box of Dub : Dub Step and Future Dub (2 volumes também pela Soul Jazz) porque ao menos não há tretas e temos as participações de Digital Mystikz, Burial e Skream...

World coming down


O Externato Novo Calipso onde andei - 5º ao 9º ano - vai fechar amanhã. Mobílias e outros objectos estão a ser despachados, à venda por "tuta e meia". É provavel que uns parceiros meus irão lá buscar coisas para termos mobília para um espaço cultural a abrir em Janeiro 2009 - preparem-se! É estranho todo este processo de morte, húmus e nascimento.
Algures nestas fotos tiradas pelo camarada Seringa está o reflexo do meu professor de Matemática - e dono do colégio -, o terror da escola. O homem de barba e sempre de batina branco que todos respeitavam. Um homem de ferro para qualquer puto de 11 a 15 anos que andasse por lá. Ainda bem que foi lá o Seringa, não sei se teria coragem de voltar a este sítio e ver o meu ex-professor. Lembro-me de ir lá, à alguns anos, falar sobre bd aos alunos e achar que todo o sítio era muito mais pequeno do que aquilo que imaginava.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Invisual 2.2 || RÁDIO ZERO

Esta Quarta, às 20h vai para o "ar-virtual", cortesia da famosa Rádio Zero, a segunda emissão da "segunda temporada" do Invisual, um programa que pretende divulgar as promíscuas relações entre a banda desenhada e a música.
Produzido por
Marcos Farrajota, este programa marca o regresso às entrevistas a convidados com um repetido, o autor de bd e escritor David Soares - que já esteve na emissão de 16 de Maio.
Haverá pérolas e novidades ligadas à bd e à música, pelo menos uma delas ligadas à Finlândia.
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É repetido no Sábado, às 13h. Playlist: Diamanda Galás, Depeche Mode, Miss Kittin, Mão Morta, Wigwam, Marduk e Suffocation. Podcast aqui depois da emissão.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Invisual 1.2 || RÁDIO ZERO

Esta Quarta, às 20h (NOVO HORÁRIO!) vai para o "ar-virtual", cortesia da famosa Rádio Zero, a primeira emissão da "segunda temporada" do Invisual, um programa que pretende divulgar as promíscuas relações entre a banda desenhada e a música.
Produzido por
Marcos Farrajota, neste programa haverá pérolas e novidades ligadas à bd e à música. Iremos à descoberta da Finlândia, reviveremos os Secret Chiefs 3 e o festival Boom (de bd! e em S.Petersburgo!), e saudamos os regressos a Portugal de Kriistina Kohlemainen (do festival SPX e directora da Bedeteca de Estocolmo) e o inglês Dave McKean (o respeitado ilustrador e autor de bd).
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É repetido no Sábado, às 13h. Playlist: Secret Chiefs 3, Goran Kajfes, Machine Head, Front Line Assembly, algo da compilação de Hip Hop russo Cepesa Russia's nº1, Kari Kuuva e J.O. Mallander. Podcast aqui depois da emissão.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

From: Division House Tue, 14 Oct 2008 02:49:19 +0000 Subject: RE: sc3

Olá Marcos
Já li o livro... e gostei do livro, acho que foi mesmo boa ideia compilar tudo numa mesma edição. Apanhei uma valente gripe desde SC3, e as primeiras gargalhadas, foram provocadas pela leitura de tiradas tuas decorrentes das vicissitudes da tua lúgubre existência. A “tua dor de braço” ser uma possível doença psicossomática resultante da tua timidez, quase que me deslocava os maxilares. Coincidência das nossas vidas: na altura, fui de propósito ao Dramático de Cascais, para ver My Dying Bride. Por razões que já não consigo descortinar, acabei por apanhar uma monumental bebedeira de uísque com um puto de Cascais, e quando finalmente decidi ir para dentro, ao entrar no pavilhão ouço: “Thank you, Portugal, See you next time!” e já só os vi de costas. Até hoje... Vingo-me num concerto em DVD que tenho deles. Apesar de na altura já quase não ouvir Iron Maiden, após um grego algures pela zona, acabei por me consolar com os velhinhos Maiden. Na bancada... Entretanto uma besta arranca-me o piercing do nariz com o casaco e por pouco também o nariz, que não parava de largar sangue. Na saída, a policia “varria” todo a gente. Escondi-me atrás de uma roulote e consegui ir ao pavilhão e convencer um gorila a ir procurar uma coisa que tinha perdido. O lixo era imenso, e apesar das minhas tentativas, nunca mais encontrei o pentagrama. Entretanto, após insistência, disse ao gorila que andava à procura de um piercing. Quis me bater. Só filmes. A bebedeira não passava, e não conseguia vir acordado para ajudar o condutor. Perto de Coimbra, abro os olhos e vejo ele em velocidade máxima a fazer a estrada do outro lado dos separadores (na faixa contrária...). Perguntei porque o fazia, respondeu-me que era para se manter acordado. Pedi desculpas por eu não conseguir manter-me acordado e sugeri-lhe que parássemos. Disse que não. Limitei-me a fechar os olhos e pensar “Que se foda... é um dia como qualquer outro para morrer. Além disso não vi My Dying Bride...” Foi um dia como muitos outros, intenso e com doses industriais de vida, estupidez, sorte, vazio and so on...
Desculpa a descrição... Mas como também foi um dia que te marcou, tá-se...
Abraço
Paulo

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Invisual guestlist

Estiveram na primeira temporada (Out'07/Ago'08) do Invisual:

#41: autor inglês de bd Sam Wilson e a Rita Vozone (01.08.08)
#40: João Maio Pinto, autor de bd e ilustrador (25.07.08)
#33: Richard Câmara, autor de bd (06.06.08)
#32: especial Bandidos Desesperados Invisuais (28.05.08 / 30.05.08)
#31: Pepedelrey, editor e autor de bd (23.05.08)
#30: David Soares, escritor e autor de bd (16.05.08)
#29: Nuno Franco, jornalista e dono da loja Soundcraft (09.05.08)
#28: Sara Figueiredo Costa do Beco das Imagens (02.05.08)
#27: JCoelho (25.04.08)
#25: Ricardo Martins dos Lobster (11.04.08)
#24: Rita Braga (04.04.08)
#23: autor Pedro Zamith (28.03.08)
#22: autor/editor/impressor Lucas Almeida (21.03.08) e que fez o desenho do lado.
#18: Biu, Roberta, Stevz e Gomez do Bongolê Bongoró, e ainda o Pepedelrey (22.02.08)
#12: Jakob Klemencic e David Krancan da eslovena Stripburger (11.01.08)
#9: autor/editor italiano Alberto Corradi (21.12.07)
#8: unDJ GoldenShower (14.12.07, sessão de unDJing)
#1: autor/músico suiço Roman Maeder do Milk+Wodka (26.10.07 - gravado em Junho)

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

DEA report on "Troca de Discos com unDJ GoldenShower || BAR DO BAIRRO"

flyer de Jucifer

Outro fiasco de sessão de Troca de Discos em que até o paciente Gama ficou fodido. Ou porque o pessoal já não tem discos e não os quer carregar - viva os Ipods e a Digitalia! - ou porque é à Terça ou porque começa tarde, ou porque ninguém curte o GoldenShower, a verdade é que o pessoal não aparece... Claro que ainda troquei coisas, uma banhada como Rockin' House (Virgin; 2004), colectânea ElectroClash com nomes sonantes como Punk Division a pegarem nos White Stripes, Justice vs Simian, Miss Kittin, Audiobullys (o que é feito destes gajos?) e Fatboy Slim entre outras coisas para dançar entre o House mentecapto e o Rock fajuto...

O Gama foi um querido e ofereceu-me dois clássicos, o último álbum dos Cannibal Corpse com o primeiro vocalista Chris Barnes, The bleeding (Metal Blade; 1994) que é uma bomba escatológica de Death Metal pujante, e o obscuro Min Tid Skal Komme (Misanthropy; 1997) dos Fleurety, uma inesperada estranha banda noruegesa de Black Metal Progressivo - muito interessante! Bem porreiro as ofertas do Gama, dankes very muchas!
Com ele ainda troquei o primeiro LP da parvite da Nina Hagen (cujo lado B não é mau de todo, "Kraut Punk"?), um "best of" dos B-Thong (Crossover da Suécia a lembrar um bocado os Optimum Wound Profile) e o «primeiro single 7" de Noise português» (!?), Randomizer (Scion; 1997) de Plan.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

lalalalalala toing!

Mais boa música da Finlândia desta vez com as produções da Lal Lal Lal, editora de referência em questões experimentais e psicadélicas por aquelas bandas.

Começo com os Avarus, "banda da casa", uma vez que os seus criadores são os donos da Lal Lal Lal, e também uma referência elogiada pela Wired. O álbum Vesikansi (co-edição Secret Eye; 2006) é emblemático do projecto: tocado e gravado de uma vez só (aliás ao vivo no Lazybird Club em Dublin), é improvisado até ao tutano, provavelmente só com um microfone para gravar a barulheira industrialoíde feita sabe-se lá com que instrumentos tal é a estranheza que se ouve da rodela. Parte da estranheza deve-se ao facto que os músicos finlandeses tocam com qualquer coisa que lhes venha parar às mãos, desde paus de uma árvore a instrumentos musicais "oficiais" (estragados ou não) ou inventados - uma tradição de Histeria Ártica, diga-se de passagem - talvez por isso que há tantas fotos de morsas na embalagem, esses pesados animais árticos de pele enrugada. A capa cheira-me que foi pintada e montada por Roope Eronen do atelier de bd Kuti Kuti.

E por falar de instrumentos inventados e no Eronen. Neste caso, é mais instrumentos moribundos no projecto Nuslux e o o CD-R Triple (Ed. de autor; 2007) que é Eronen (dos Avarus e cabeça da Lal Lal Lal) a solo a torturar dois osciladores em curto-círcuito ligados a três copos de água. Os sons são estridentes e arrepiantes como se as máquinas tivessem aprendido a foder, ou pelo menos, a masturbar. Quando pensavamos que não se conseguia fazer mais música irritante... eis um finlandês espertinho para nos provar o contrário - um outro CD-R de Eronen ao que parece ele usava um moribundo sampler Yamaha a dar o pifo... Mas como diz o Merzbow «Noise para mim é a música Pop».

A Lal Lal Lal edita também vinil, arranjei dois singles:

Kompleksi: (I Ain't No) Lovechild / Moscow 1980 (2005) é Electro-Trash do pior feito por um duo da cidade de Tampere com pancadas por sex-shops (é Electro, certo? ergo sexo) e fetiche estalinista. Por isso quando os sintetizadores disparam somos levados para parvalheira kitsch retro-pimba que serve para lembrar como os tempos eram simples antes do muro cair. O disco é acompanhado por um cartaz A4 fotocopiado de uma colagem manhosa (estilo punk'zine) de glórias soviéticas. Alguém lembra-se do Misha? Exacto: Moscovo 1980...

Javelin: Oh Centra (2006) não são finlandeses mas sim norte-americanos de Providence - mas nada de Noise Rock por estas bandas! Também é "kitschtrónica" com aura de inocência infantil, que se deve em grande parte por causa da capa com gatinhos desenhados, aos sons 8 bits e às vozinhas de Estrumfes pastilhados. A cadência é muito Hip Hop, no entanto. Giro...
Curiosidade, quer Javelin quer Kompleksi soam bem em 33 ou 45 rotações... Creio que deve ser esta uma das vantagens de ter gira-discos.


Por fim, ainda nota para outra edição finlandesa, não da Lal Lal Lal mas que se insere em sintonia com as atitudes DIY e Improv que há tantas num país com metade da nossa população. Neste caso, estamos no campo do Jazz com On Duty (Kissankusi; 2007) dos Black Motor que é um CD-R ao vivo com quatro temas Free mais mal-gravados que os CD's do zine Galatic Zoo Dossier - o som está todo distorcido que parece um "bootleg" feito pelo puto mais ranhoso do planeta. De positivo é a energia da banda e o à vontade do trio para fazer versões quer de uma música do Billy Childish quer de Redd Stewart & Pee Wee King. Os finlandeses gostam de baralhar - experimentar é a palavra certa - e é por isso que gosto deles!

PS - Kiitos Roope Eronen e Tommi Musturi!
PPS - ficou de fora um CD dos Fricara Pacchu porque pretendo fazer uma tira a criticar o disco...

Emma Petit et al. (ed.): "Old Rare New : The Independent Record Shop" (Black Dog; 2008)

Os anglo-saxónicos editam grandes livros. A Black Dog edita grandes livros. E o problema de alguns "grandes livros" é que muitas vezes podem ser apenas bonitos de ser ver e folhear mas ao espremer a coisa, pouco sumo deitam cá para fora. Ao contrário de um disco vinil em que podemos mudar as rotações e acelerar a música de forma que ela (ainda) fique divertida, não se pode fazer um livro à pressa. Muita gente fala mal da indústria fonográfica e os seus fenómenos Pop nojentos mas esquecem-se que um livro também pode ser tão artificial como o 50 Cent – talvez pelo excesso de respeito pelo “Livro”, esse clássico da cultura, que os discos nunca conseguirão ter um IVA similar. Os Henry Potter podiam ser vendidos com um IVA de 20% mas as pessoas têm pudor em deitar o “Karl Marx era Satânico” (a não ser que se goste de bizarrias culturais) para o lixo ou queimar o “Como obter Felicidade na Vida” (qual deles?) ou o “SCUM” da louca da Valerie Solanas. Ei! Relaxem, alguns livros merecem destinos tão baixos como certos discos de músicas de Natal ou de EBM.
Não será bem o caso deste livro embora o luxo gráfico seja desnecessário para tão pouco conteúdo. Acompanhado com boas fotografias de lojas e proprietários e de reproduções de capas de discos (ora bizarros ora de culto mas sem qualquer catalogação ou referência intrínseca aos textos), o Design é bastante atraente e limpo para querermos levar o livro para casa mas infelizmente pouco serve de referência enquanto livro sobre música - o objectivo não é esse mas sinto que os volumes da Re/Search sempre estarão à frente de muita coisa que se edite. Old Rare New É na realidade um guia "deluxe" e burguês para quem quiser ir às melhores lojas dos EUA e de Inglaterra e que prega para os “convertidos”. Apesar das colaborações, em forma de crónica ou de entrevista, de James Dean Bradfield (dos Manic Street Preachers), Steve Krakow (o MEGA-cromo do zine Galactic Zoo Dossier), Devendra Banhart, Stuart Baker (da Soul Jazz), Billy Childish, Bob Stanley (dos Saint Etienne), Bonnie 'Prince' Billy entre outros, pouco sabem dizer mais do que lugares-comuns de quem colecciona coisas - neste caso, música disseminada em discos em vinil e em vinil apenas...
Lugares-comuns? Então são "as belas capas que só um vinil pode estar associado", "a tactilidade e ritualidade implícita do objecto", "o gozo em encontrar raridades enigmáticas", "as disputas entre coleccionadores", "as lojas excêntricas e caóticas repletas de discos ao ponto dos clientes terem dificuldade em encontrar o quer que seja a não ser que perguntem aos donos", "as histórias da génese pelo amor pela música (ou pelos discos)"… Enfim, talvez pelo formato “chapa 5” das entrevistas algo falha neste livro, transformando-o numa Grande Ode à Loja de Discos em Vinil pelos Nostálgicos Pós-Trintões. Pegar neste livro poderá ser uma descoberta para o jovem da geração mp3/download que nem sabe o que é um CD (que horror!) mas ainda assim ele poderá ter dificuldades em pegar nele porque também não sabe o que é um livro graças à TV, vídeo-jogos, áudio-livros ou livros digitais – e no fim de contas, é isto que satura neste livro é que os coleccionadores de discos esquecem-se que o gosto pela cultura é acima de tudo elitista - sempre foi e sempre será. Podemos ter um Bilião de GB de música no PC mas isso não fará da pessoa um melómano ou culta nem trará uma tragédia a toda a indústria fonográfica (editoras, bandas, lojas). Quem gosta música ou de cultura, no inicio pode começar a acedê-la pelos meios mais baratos (pobres ou democráticos como quiserem chamar) e mais tarde com a idade e rendimento adequado é que se procura meios mais nobres – por exemplo eu tive centenas de k7’s porque não tinha dinheiro para comprar discos. Se hoje fosse um jovem estudante faria o mesmo, tentaria conservar a música que fosse interessante e que eu prezasse ao ponto de querê-la ter num formato material como um vinil ou CD antes que o PC pifasse de vez. O resto, ou seja, as milhares de gravações e downloads ilegais de trampa Pop poderão desaparecer que até é uma bênção. O facto dos “putos de hoje não saberem nada” é um chavão de trintões ressabiados em perfeito conflito geracional não-assumido (os últimos pensam que são melhores porque já foram Punks ou uma merda pseudo-iluminada assim do género) mas quem gosta de Madonna tanto faz ter em mp3 ilegal ou o mesmo tema em vinil amarelo limitado a 500 exemplares, aliás, o mp3 é sempre mais barato e felizmente mais descartável - quem sabe quando a Humanidade desaparecer, a raça alienígena que visitar os restos mortais do planeta não encontrará tantos artefactos pirosos que nos façam diminuir culturalmente perante as outras raças do Universo.
O futuro dos discos e das lojas dos discos é várias vezes referido no livro pelos entrevistados, a maior vezes como uma calamidade de quem não sabe que há coisas mais importantes no planeta Terra. O alarme é estranho e deslocado, tal como na pintura ou outras artes, a música vive tempos de ruptura e de crise com fenómenos estranhos: desde de alguns músicos serem convidados a fazerem "curadoria" como se fosse galeristas - Festival All Tomorrow Parties - ou o mais estranho, e creio que noutras artes não houve nada assim, que se o Rock foi uma música rebelde, então o que se faz com uma geração baby-boomer de artistas rebeldes que nunca mais morre? Entre os Rolling Stones e o Ozzy, ainda faltam dois Beattles e uns três Bee-Gees... o resto anda cá tudo! Felizmente só os Punks Rockers tiveram mais dignidade em morrer mais cedo para não assistir ao coleccionismo e ao fetichismo dos rebeldes.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Alah Rocks!!!


Boris & Merzbow: Rock Dream (Southern Lord / Sabotage; 2007)
v/a: Waking Up Scheherazade: Arabian Garage/Psych 60's-70's (Grey Past?; 2008)

O Ocidente adora o Oriente sem o assumir e sabe que de "lá" pode aprender muito e até roubar ideias (de forma aborrecida) o que os Orientais inventam. Uma lista? Soka! Do Médio ao Extremo Oriente: Rock psicadélico,Tamagoshi, Haikus, Haxixe, Zen-Zen, Tao-tao, Mao-Mao, Buda-Buda, Dalai Lamas, Kama Sutra, 1001 noites, Dragonball, Ópio, Japanoise, Nusrat Fateh Ali Khan, Hello Kittie, e claro o "ultimate tantric orgasmatron": siga a sua vidinha quotidiana chata e um dia deste, quando menos esperar, leva com dois Boeings 767 nos cornos.
Claro que é um Amor não assumido, porque os Ocidentais vem a História da Humanidade quase que exclusivamente de forma eurocêntrica: houve chimpazés, homídeos, sumérios e múmias mas desapareceram excepto as últimas, depois veio a Grécia, Roma, o idiota do Jesus (que andou a chupar muito orientalismo pelos vistos), e o cataclismo-mor, ou seja, a Roma Católica. Depois os portugueses foram até ao Extremo, os italianos e franceses inventaram o "Humanismo", os ingleses a Revolução Industrial e os norte-americanos o Neo-Liberalismo e a TV por cabo... O resto do planeta sempre foi primitivo e não contribuiram em nada a não darem chatices e a matemática quando os árabes ainda não eram fundamentalistas... tá-dá! Não é um óptimo resumo de 200.000 anos de Homo Sapiens? Eu acho que é...
Entretanto os Ocidentais sempre aborrecidos têm descoberto que afinal os primitivos, manhosos do caraças, afinal até tem coisas boas e influentes sobre a nossa cultura do tipo, não haveria Death Metal sem África nem chamuças sem os indianos.
[falta texto aqui para fazer relação com o que foi dito e a resenha dos discos já seguir... que se lixe, estou de férias não me apetece escrever muito, fica assim mesmo!]
O primeiro disco é um "nuggets" de países árabes, a saber do Líbano, Algéria, Irão, Egipto no período de 1966 e 1972, ou seja na altura em que os países ainda não tinham apanhado com revoluções islámicas (como o Irão) e estavam abertas à Democracia e os "valores ocidentais". São 12 bandas e 16 faixas (4 bandas repetêm-se no lado A e B do LP) que usam o Rock e o som "étnico árabe" em perfeita fusão de estilos, embora algumas não fujam muito do "template" anglo-saxónico do Rock dos anos 60's como os Kool Kats. Alguns cantam em inglês, outros naquela algaraviada que ninguém entende. Cantam também na essência músicas de Amor excepto os libaneses The News que na letra fazem-se passar por habitantes da lua e à procura da Paz (é para rir mesmo). Destaque para os Sea-Ders (verdadeiros Beatles do Ali-Bábá e que em breve a Groovie irá reeditá-los), El-Abranis (detentores de um groove primitivo e quase assustador!), Morocco que foi gravado nos EUA e aproxima-se de um estereotipado Belly-Dance / Exotica mas com uma cavalgada Garage caótica, os Raks com o seu Raks Dance até podem estar a cantar que as formigas são giras e trabalham muito mas a malha deles é tão potente que quase apetece vestir um cinto de explosivos e suicidar-me para dentro de uma carrinha de transporte de putos israelitas; mas a melhor de todas é Kareem Issaq & Middle Eastern Rock (gravado também nos EUA) que mais uma vez numa língua incompreensivel usa um "fuzz" infernal e um andamento mortal, Besaha é o nome desta petita de ouro negro! O disco deve ser "pirata" mas é um verdadeiro "must have"! Não há nome de editora em lado nenhum embora uma investigação na 'net aparece a Grey Past como possível responsável. Por cá encontrei o disco na loja Vinil Experience. O disco, em vinil (claro está) é colorido - violeta psicadélico tal como é o triplo vinil dos "Merzboris".
Pelo menos a minha cópia dos "Merzboris" é também tal como outras 999 cópias sendo que eainda existem mais 1000 exemplares em vinil vermelho e ainda outros 800 a laranja... O que há mesmo é uma especulação sobre os produtos Boris, cheio de edições limitadas e tratamento deluxe - um tratamento auto-infligido ao que parece porque até convidam o mestre Merzbow a tocar com eles mesmo que os resultados sejam pouco interessantes. Não sei se é por culpa do vinil que se separa em 3 discos - o que equivale a 6 mudanças/interrupções para escutar o álbum todo - ou se das capacidades dos próprios protagonistas mas algo não funciona bem. Boris e Merzbow tocam ao vivo num clube em Tóquio, Boris com aquele Rock manhoso e o Merzbow a bombardear barulho digital sem que alguma vez haja uma símbiose das duas entidades. Talvez possa haver um momento ou dois interessantes mas no geral parece que temos uma banda de Rock de um lado a tocar os seus temas de sempre e do outro um gajo do Noise a tentar chamar a atenção ou a foder as músicas dos outros - como unDJ GoldenShower já brinquei também desta forma mas não editei nenhum álbum de luxo.

Obrigado a Jucifer pela prenda de aniversário Merzboris, e ao Pedro Stuka pelo maxi Motor-Momy-Army (Ed Banger; 2008) de Sebastian, um tipo electro-noise na onda de T. Raumschmiere.