quarta-feira, 30 de novembro de 2005

Boyd Rice: "The Vessel of God" / M. Janeiro: "Porto do Graal" (Terra Fria, 2005)

Depois de ter revolucionado umas três vezes a música popular com a sua capacidade iconoclasta, Boyd Rice só podia entrar, a seguir, no Esoterismo. Duvidosa será a utilidade do Esoterismo, uma espécie de bicho-papão intelectual que nunca ninguém saberá o que é, para que serve, se existe, se funciona, etc... até porque na teoria quem sabe "a verdade" são organizações secretas tão importantes como três batatas. Se elas existem e influenciam o mundo, não será por terem um conhecimento elevado e divinizado - Julius Évola (1898-1974) explicou isso tão bem em Revolta contra o mundo moderno (1934; edição portuguesa: Dom Quixote, 1989) - mas apenas porque tem poder económico e político, como aliás, qualquer clube de amigos terá para um fim ou defesa de interesses.
O livro de que aqui escrevo foi oferecido no último concerto de Rice em Sintra - coisa estranha mas de salutar: ir ver um concerto e receber um livro! - em que temos alguns ensaios de Rice e um de M. Janeiro. Ambos textos estão publicados no original e com uma tradução (de inglês para português no caso de Rice, e vice-versa para Janeiro).
Rice tem viajado pelo mundo e descodificado alguns mitos - vejam thevesselofgod.com - como são os casos apresentados no livro, dividido em três capítulos. Revela como a Igreja Católica explorou o paganismo e toda uma cultura anterior à dela, e como aliás, acentuou a exclusão das divindades femininas no seu folclore - situação que já vinha do judaísmo. E é a partir dessa perda, que surge o mito do Santo Graal, a procura do Sangue Real de um "par divino" (Jesus e Maria Madalena). A escrita de Rice é cativante com as comparações entre a história cristã e a mitologia pagã, ou como as estórias da História se repetem em espirais tele-novelescas sem que nos darmos conta. E talvez seja aqui que este "esoterism 101" tenha de positivo - por revelar o esquecimento perpetuado pela História dos vencedores, ou seja a da Igreja Católica e do Capitalismo.
Já o Porto do Graal trata de enaltecer Portugal como uma nova pátria espiritual a ser criada (e governada?) pela Ordem Militar dos Cavaleiros do Templo de Salomão. Ao que parece, havia todo o interesse que D. Afonso Henriques criasse uma nova pátria europeia para que a Ordem fundasse o seu porto de virtudes. Curiosa tese que tem tudo a ganhar pela investigação científica mas que põe tudo a perder com uma conclusão tola do autor, que quase parece um fan boy babão de Portugal, espécie de extrema-direita pseudo-iluminada sem sentido de humor - do qual faz parte 90% do público de Rice e cia.

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